19.5.10

MUNDOS DE EUFRÁSIA II


Quando eu vinha aqui neste blog desabafar as angústias e também as delícias de escrever Mundos de Eufrásia, mergulhava tanto no processo criativo, que era como se o romance fosse ficar para sempre nesse estágio de latência: um livro por vir. Acho que seis anos pode ser tempo suficiente para causar essa impressão em um escritor, de uma quase eternidade. E agora é tão curioso para mim perceber que me afasto do livro, enquanto outras pessoas se aproximam dele. E são essas pessoas, que lêem o livro agora, que o trazem de volta para mim. Então é como se nos reencontrassemos. Sou grata a quem tem me dado esse presente. É como se fosse uma visita de uma pessoa muita querida, com quem convivi intensamente nos últimos anos, e de repente, não nos vemos mais como antes, apenas casualmente.

Agradeço a querida escritora Adriana Lisboa (Autora dos belos livros Rakushisha, O Beijo da Colombina, Sinfonia em branco, entre muitos outros, leituras fundamentaispara quem quer conhecer o que tem de bom e do melhor da nossa literatura contemporânea ) a quem admiro até não poder mais, e continuo depois mesmo não podendo, que escreveu um lindo e generoso post em seu blog Caquis Caídos sobre a sua leitura do meu romance. Deixo o link para quem quiser dar uma olhada. http://caquiscaidos.blogspot.com/2009/08/mundos-de-eufrasia.htm Não só neste post, vale a pena navegar pelo blog inteiro da Adriana, que é ótimo.

E às vezes me surpreendo com o e-mail, a mensagem, como há aqui em alguns comentários, com o retorno de pessoas que leram o livro, pessoas que não conheço, e não me conhecem, que o livro e a literatura nos uniu. Retorno de leituras que me trazem alento e força para continuar nessa rotina equilibrista e inconstante, onde não há muito descanso, nem a sensação de um ponto de chegada, mas de movimento incessante e renovado, onde o horizonte é sempre outro ponto de partida.

É incomparável saber, por esses retornos, que a história de Eufrásia está tocando algumas pessoas que lêem o livro. Mais incomparável ainda é ver que algumas pessoas acham que o livro não é apenas um romance histórico, que não se trata apenas de uma história de amor passada no século XIX, que a vida da Eufrásia é também a vida de prisões familiares, sufocamentos, decisões e escolhas fundamentais, abertura de caminhos, busca de liberdade. A minha maior alegria foi receber esse retorno, porque esse sempre foi o sentimento principal que pairava sobre a escrita. A fricção e o embate entre a vida pública e a privada, as demandas externas sufocando as internas, a necessidade de escapar das prisões sociais e familiares que enredam. A intimidade dentro da experiência maior e menor de nossas vidas. Isso tudo é mais vital, foi ao menos para mim, do que retratar uma época, personalidades históricas, uma história de amor. É maravilhoso, para o autor, quando o leitor toca nessa mesma tecla, que é a essência do livro.

Quando essa nota essencial é ressoada pela leitura, é o escritor que vibra, podem acreditar. Não há nada mais belo do que uma música plenamente ouvida e absorvida em seu sentido mais íntimo.

6.1.10

Novo romance


Interessante o movimento que se cria depois da publicação de um livro. Enquanto o autor, que era íntimo do livro, se afasta pouco a pouco dele, os leitores se aproximam. E são os leitores que, como quem chama uma pessoa para visitar um velho amigo, vão trazendo o livro de volta ao autor.


Agora, neste momento, de seis meses de publicação, de um ano e meio de término da escrita, só agora sinto que um espaço interno está se abrindo para outro livro. Há muito tempo que venho pensando nele, desde o último ano da escrita de Eufrásia. Venho pensando, anotando, deixando de lado, pedindo para ele esperar um pouco que ainda não estava na hora, fui esquentando as idéias no banho maria, fermentando pouco a pouco as imagens e personagens que vinham surgindo, até que, em março de 2009, sentei diante do computador para fazer algum trabalho qualquer, e, quando vi, tinha escrito quatro páginas do novo romance.


Essas quatro páginas me trouxeram o clima, a atmosfera, os personagens, a linguagem, o ritmo e o fluxo do universo da história. Fiquei muito animada e no dia seguinte tentei continuar. Não saiu nada. Mais outro dia: nada. Nessa época, estava mergulhada na revisão de Eufrásia, pensando no livro o tempo todo, no processo, na criação, com saudade dos personagens. Percebi que precisava ir dissipando aos poucos a intensa convivência com o livro e tudo que ele representou para mim para então pensar claramente no outro.

E agora, que ultrapassei as quatro páginas, vivo um momento de expectativa total. Aquele momento da criação em que você ainda não escreveu o suficiente para saber qual é "a cara" do livro, qual formato ele vai ter, e cada passo dado, cada nova página, é uma incrível descoberta.

E essa emoção da página em branco: como vou preenchê-la? Vou conseguir preenchê-la?


Bem, é uma delícia, e uma angústia também.


Mas, confesso, estava com muitas saudades de escrever. De entrar no universo de uma história. De ser absorvida por ela. De "ver" os personagens, de ser assaltada por eles nos momentos mais inesperados, fazendo café, andando na rua, na fila do banco.


Hoje fui dar uma volta na praia com o único e exclusivo objetivo de pensar na história e nos personagens. Quando vi, estava anotando coisinhas no caderno enquanto andava, gesticulando e falando alguma coisa pensando nos personagens, enfim, doida de pedra.



Mas como é bom enlouquecer um pouco.